quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Lua do Oriente

Dia 11 de agosto de 09

Uma seqüência de percepções que talvez uma outra pessoa tivesse em um ano de vida, eu tive nesses últimos três dias. Mais uma vez, é vitorioso nascer a cada manhã e morrer em uma mente velha e cansada a cada noite. Mas é triste que o conhecimento profundo só nos dê créditos quando nossos corpos estão cansados, e velhos. Às vezes sinto minha mente exausta, mas estou distante demais de ser como a fortaleza de minha avó, hoje completando 82 anos.
A viajem por essas estradas da vida me fizeram pensar nas tantas analogias com esse tema eu já ouvi, e na madrugada de sábado, entendi.
Escutamos todos dizerem que o tempo está se acabando, é um modo de fazer o medo que sentimos torna-se impulso àquela mudança. Mas o medo é improdutivo, aqui. A vida é deixada pra amanhã, por que hoje não se pode parar para viver intensamente. E o amanhã... existe? Não. Quando o amanhã chega, já não é mais amanhã, é Hoje, e haverá sempre o amanhã inalcançável.
Aqui onde os dias passam, semanas, mês após mês, e os anos. Não é o medo de morrer que nos faz querer viver, por que no fundo temos a certeza de que estaremos tão vivos quanto hoje. Mais felizes? Não importa. Mais ricos?
O dinheiro foi inventado por uma pessoa heróica para que o ser humano, em sua ignorância, tivesse um motivo para motivar-se e não desejar dia após dia acabar por eliminar sua espécie. O motivo maior pelo qual ainda não estamos em extinção.
Pensa que não há por que acordar pela manha se não pelo dinheiro. Não há por que buscar a saúde se não para trabalhar melhor e produzir mais, pelo dinheiro. O amor, que de nada te trazia o lucro, extinguiu-se. No mundo, o que não se pôde comprar, foi exterminado. O homem sente-se impotente perante a algo que, engolindo ou não, o seu dinheiro não pode comprar. Então, dá sua alma e sensibilidade para eliminar. Ninguém se sente mais amado, por isso é mais fácil brincar de teatro nas festas e baladas da vida. Lá é a Vida perfeita que todos querem ter... quase todos.
E ficaram na estrada às minhas costas, aqueles anos que a todos do mesmo sangue juntos sofreram com a insensibilidade, a diferença do temperamento entre família; a Indiferença. Aqueles anos que me deram apenas uma chance para fazer a escolha, e tentar fazer a coisa certa. Não posso mais nem imaginar meus pais casados. Dói demais... o dinheiro continua não comprando Nada de valor real a mim. Infelizmente até nosso corpo depende dele, além da mente que se polui quando direcionada a meios de comunicação que escondem sua ignorância por trás desse glamour, desse programa pobre que dita o consumismo. Liga o botão da televisão e te senta; recebe tu as instruções para transformar-te em máquina de produzir lixo. E continue produzindo...
Ademais...
Acredito que tenhamos feito a coisa certa. E estamos ainda fazendo. Mudamos; o que importa é que estamos vivos e, de certa forma, mais inteligentes.
Na viajem, fiquei com duas poltronas pra mim e uma janela grande pra admirar as estrelas e a noite. Nem tão cheia, mas incrivelmente brilhante, tivemos uma conversa...
Ouvi a viajem inteira as músicas clássicas, meus pontos de partida para a produção mental. Mas senti que mesmo sem compromissos com ninguém ou com nada, minha cabeça já não sabe mais parar de pensar. Não consigo parar de estudar a realidade. E estou começando a não querer transformá-la... Apenas entende-la. Eu sozinha mudo apenas a mim mesma.
Tudo ficou tão claro, mesmo na escuridão da noite. Todos pareciam estar dormindo, mas minha cabeça a todo o momento produzindo, não consegui encontrar paz pra descansar... não consigo paz a dias. Tomei as dores do mundo que também não descansa...
Enquanto passando pelas cidades, do céu nada se notava... mas de repente tudo era deixado pra trás e mergulhávamos na escuridão da noite; tudo era preto absoluto enquanto o céu era de azul marinho imenso com pontos de luz e a lua. Algumas luzes acesas ao meio do nada, vida que me parecia tão calma e intacta pelo consumismo e pobreza de espírito. A vantagem de não se conhecer o conceito humano de “avanço”, que, pra mim, esse abismo.
As cidades e vilas, pessoas, carros, luzes, tudo passando e ficando pra trás, e a lua no céu, me acompanhando, sem sair do lugar. Isso não me deixa fugir do pensamento sobre a Vida.
Quem seria a nossa lua, enquanto tanta história é deixada para trás?
A lua e as estrelas... Sozinha, aprendi que não existem coisas comuns, existem olhos insensíveis. Quero aprender mais ainda a ver tudo isso como o milagre que é.
No escuro lá fora, as arvores, os galhos eram desenhados em preto no fundo azul. O preto absoluto. A música... eu até que cheguei em Cascavel rápido... não ocupei minha cabeça com o vazio existencial.
Minha família tem sido o principal assunto. Três e meia da manhã encontrei com a minha mãe e estranhei como é bom estar de volta para casa, mas ainda preciso de momentos sozinha.
Desde que cheguei estamos fingindo e fugindo de assuntos que nos estão causando a tristeza, para que não nos cause mais ainda.
Pelo medo de escutar coisas ruins, evito dar palpites. Estou quieta, e pela primeira vez minha família me pede pra falar.
Onde está aquela criança alegre, falante, inconseqüente e valente?
A inconseqüência nos empurra aos braços da maturidade, tão rapidamente. Hoje, eu cheguei aqui.
Idealizar e saber demais das coisas me causa medo... saber ao quê posso me atirar, sentir e saber o que os outros sentem, me trazem medo dos meus 40 anos. Medo de ficar fria, alimentando-me de teorias... por que será que um dia jogar lixo na rua era normal pra mim? Por que hoje sou escrava do querer fazer a coisa certa?
Observei, do outro lado da mesa do café, minha avó fazendo seus 82 anos. Vida, que permeou. Vida, que tantas vidas outras possibilitou. Tenho me visto tantas vezes observando as coisas, pessoas, atitudes... antes de me esconder atrás de livros, quero conhecer-te, ser humano.
Pedi a minha avó que nos abençoasse com uma oração. Um botão de rosa se abriu dentro de mim quando seus olhos se encheram de lágrimas, embaçando a sua visão de filhos e netos ao redor de sua mesa. Como seria se sentir ser responsável por tantos milagres? Uma fortaleza.
No ateliê de artesanato, minha mãe comprou uma casinha de beija-flor pro jardim da vovó, e eu a pintei e decorei com arabescos em azul clarinho e branco, e no telhado, listras. O abraço dela ao me agradecer me motivou a fazer mais mil daquelas, se necessário.
Os valores da família se multiplicam quando uma distância os divide.
Minha avó está mais triste e parafraseia sobre a morte, minha mãe mais confusa, meu pai mais carente, minha irmã mais nostálgica... Queria poder saber a resposta a tantas dúvidas.
Na noite passada, então sozinha com a minha mãe, tive a oportunidade de ouvir Tiersen em sua presença. Dividir um estado de espírito, e novamente, mais lágrimas.
Deus, me livre dessa sensatez... Estou com medo do realismo.
Grandes alegrias silenciosas me vieram como presente depois do primeiro passo em minha cidade natal. Evitando dizer pensamentos em alto tom, procurando ouvir mais.
Uma luz muito forte me trouxe encanto na mesma noite em que chorei pela sensibilidade com minha mãe... a qual me fez acreditar que a Lua, mesmo que se esconda atrás do preto absoluto, continua nos acompanhando enquanto passam as cidades, vidas, gente, realidades.
A sua ausência nos faz crer que tudo passou, como ao resto da estrada. Mas de repente até a montanha fica pra trás, e lá ao seu lugar aparece a lua, a majestade. E em vida, à minha realidade, ela apareceu em palavras. Lágrimas lhe dão boas vindas e lhe entregam a surpresa, confessando a maneira de como ela tem o poder de te fazer feliz. Bem. Em paz.

Hoje estou aprendendo que muitos aconselham fazer o bem por que é bonito bancar o da paz, mas vivenciei e fui realmente recompensada, e agora entendo por que Madre Tereza foi inexplicavelmente feliz. Jamais fiz algo semelhante ao que ela fez, mas o mínimo que pude fazer hoje transformou minha vida, transformou a mim, para sempre.
Muitas vezes eu fiz coisas boas e por sorte não estive esperando retorno. Aconselho-te a não desistir, por que só assim é que se pode entender a vida, e as pessoas Humanas, e sentir a razão de tudo.
Eu conquistei, de uma forma que não precisei me ferir para pagar o custo, a maior amizade de minha vida. Hoje eu sei o valor do dinheiro. Vale tanto quanto valerá para ti deitado em leito de morte. Vale menos do que lixo. Entendas tu, o dinheiro é não é resposta, é apenas um disfarce a extrema vontade de querer sentir a essência da vida. Fuga, tapa-olhos, fantasia.
... Tal será o dia que vais saber por que lhe deram dias de vida e oportunidades de fazer o certo aos outros. A oferecer-lhes o que precisam. O segredo se escreve assim. Só tu que não saber ler.
Você tem o tempo da vida para fazer o teu melhor aos outros, tens o tempo de vida para aprender que a felicidade se esconde ali.
Sentir-se feliz causou um aperto no peito, dor. Juntei minhas mãos ao rosto, e na escuridão, chorei. Debrucei-me sobre a mesa e observei o luar pintar o quarto de azul marinho. Meu corpo arrepiado, meus olhos inchados, e na cabeça a luz do discernimento, a clareza do que tudo significou.
Acalma-te, ser humano. O Tempo; espera dele a resposta. O senhor da imensidão de voz grossa ecoada dentro da memória, aquele que a tudo determina. Aquele que te oferece oportunidade de ser sábio; oportunidade de fazer o teu melhor ao próximo; aquele mesmo que trás de volta o que parecia ser passado, a lua que ressurgiu da montanha que também já se foi... e até a morte, ela estará. Na luz do dia, ao sol que queima, ela estará a te esperar com o frescor da noite para te aliviar e com a brisa tocar sua pele. Por que a lua não se apaga, não morre, não deixa tua alma sozinha. A mim, ela vem me curar nos piores momentos. Ela vem, e promete sempre voltar.
Contemplei a noite de luar na praia nos posts passados, e hoje em minha vida, ela veio iluminar. Ela veio em forma de alguém que é sobrenatural demais para ser uma simples pessoa... a ligação de palavras e acontecimentos que me provocam absurda nostalgia, obra viva, poema impressionista, os segredos dos olhos orientais...
...E é por que me traz a mágica presença da lembrança, que me traz quem fui. Quem ainda sou, escondida em algum lugar dentro de tanta futilidade.
Quero então dar mais valor ao meu valor. Quero hoje, dar mais valor àqueles olhos que hoje tão sinceros me fazem feliz. Àquele sorriso que jamais brilhou tanto quanto hoje...
À lua.
Paula Morais